quinta-feira, maio 24

A Porca Furou o Pico



Há muitos anos, na freguesia de Água de Pau, vivia, na Rua da Boavista, um casal com uma filha única, já grandinha. O dono da casa era um homem honrado, mas de poucas posses. Para arranjo da vida tinha uma porca de criação, um regalo de animal, mansa e boa amamentadeira dos marrõezinhos, que paria duas vezes por ano. Era um animal muito estimado por ser muito pachorrenta e também porque, com a venda dos leitõezinhos, a família fazia dinheiro para pagar a dívida da mercearia e outras pequenas contas em atraso.
Logo de manhã, a primeira coisa que o dono fazia era ir ao pé do pátio da porca ver como estava, coçá-la, dar-lhe umas palmadas no lombo em sinal de carinho. Por vezes, levava-lhe uma tigela de milho em grão que ali mesmo retirava dos carrilhos.
Aconteceu, certo dia, que ao aproximar-se do curral, não viu a porca lá dentro. Correu a avisar a mulher e começaram a lamentar-se. O burburinho foi grande e logo apareceram alguns vizinhos, que se decidiram ir procurar o animal desaparecido.
Correram ruas e canadas dos arredores. Bateram palpo a palmo a freguesia, mas não encontraram nada. Foram depois para mais longe e a filha da casa, vendo os pais tão apoquentados, também se pôs a procurar. Tanto que ela gostava dos marrõezinhos que a porca tinha levado consigo!
Lembrou-se de subir o Pico e qual não foi o seu espanto quando, ao olhar para o caldeirão que ficava na cratera, viu lá em baixo a porca deitada e rodeada pelos marrõezinhos. Muito contente e não sabendo como tinha a porca ido ali parar, a rapariguinha gritou:
– A porca furou o Pico! A porca furou o Pico!
Trouxeram o animal para o pátio e tudo voltou à normalidade. Mas a frase pronunciada ingenuamente pela menina nunca mais fio esquecida e, ainda hoje, as pessoas que passam na freguesia de carro ou camioneta, principalmente o pessoal de fora, pergunta ironicamente: “Foi aqui que a porca furou o Pico?”. Os habitantes do lugar, sentindo-se apelidados de ingénuos ou parvalhões, reagem, soltando pragas e fazendo gestos de revolta e fúria.

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